domingo, 16 de março de 2008

1º ANO: PARADIDÁTICO**1ª ETAPA


CORDÉIS E OUTROS POEMAS, DE PATATIVA DO ASSARÉ.


Os cantos de Patativa

O pesquisador e professor Gilmar de Carvalho selecionou os mais significativos cordéis de Patativa do Assaré, mais dois poemas seminais, no livro Cordéis e outros poemas, um dos dez livros indicados ao vestibular 2007 da UFC. Entre outros, o volume contém o clássico A Triste Partida, imortalizado na voz pungente de Luiz GonzagA.

Antônio Gonçalves da Silva conseguiu um feito inédito: sua poesia sertaneja, vazada em versos tradicionais, saiu dos folhetos de feira para seduzir estudiosos e pesquisadores em universidades do Brasil e de outros países. Agricultor como foram seus pais, desde novo deu mostras de inteligência vibrante, com uma enorme capacidade de traduzir em versos tanto as coisas do cotidiano, a vida no campo, o belo da natureza, como também desnudou a apartação social, a falta de trabalho e terra, os desmantelos políticos, e cantou a verdade, a solidariedade e a justiça. Estava com 20 anos quando foi cantar à viola seus versos em Belém do Pará. Lá, ganhou o apelido com que seria conhecido, a partir de então: Patativa do Assaré.

Patativa nasceu em 1909, lá na serra de Santana, em Assaré, e morreu em 2002. Sua arte começou a extrapolar as fronteiras do Ceará ainda na década de 50, quando sai publicado, pela Borsói do Rio de Janeiro, o livro Inspiração Nordestina. Mas foi com Cante lá que eu canto cá (editado pela Vozes, em 1974) que a força de sua lírica seduziria também as novas gerações dos grandes centros urbanos. Ispinho e fulô, publicado em 1983, aqui mesmo em Fortaleza, completaria a trilogia fundamental para se compreender a obra do artista. De quantos foram encantados por sua maestria, destaca-se o escritor, professor e pesquisador Gilmar de Carvalho, que organizou o volume Cordéis e outros poemas, editado pela UFC e um dos dez livros indicados ao próximo vestibular. A capa do livro é uma bela xilogravura de João Pedro do Juazeiro, Vaqueiros, que pertence ao acervo do Museu de Arte da UFC - Mauc.

O livro começa com um dos poemas mais famosos de Patativa, gravado por Luiz Gonzaga - A triste partida. O poeta narra o sofrimento de uma pequena família sertaneja, que migra para o sul por causa de uma seca brutal. Deixam para trás a casinha, o sertão, os bichinhos de criação, e partem num pau-de-arara, com o sonho de um dia voltar. Mas a realidade é outra. Na cidade grande, só encontram mais dificuldades e sofrimentos: "O pai de família/ ali vive preso/ sofrendo desprezo/ e devendo ao patrão/ o tempo passando/ vai dia e vem dia/ e aquela família/ não volta mais não". Não tem quem fique de olhos secos ao ouvir esta toada.

O segundo cordel selecionado foi feito por encomenda. Patativa do Assaré foi convidado pela Arquidiocese de Olinda e Recife - na pessoa do próprio cardeal, dom Hélder Câmara - para contar, em versos populares, o assassinato de um jovem padre ligado à Teologia da Libertação. Resultou no folheto O Padre Henrique e o Dragão da Maldade. Ele começa fazendo sua apresentação, "sou um poeta do mato", e diz que canta a natureza, a vida rural, as festas e costumes, mas também eleva seu canto aos "injustiçados/ que vagam no mundo afora". O padre

Antônio Henrique tinha apenas 29 anos quando foi morto pelas forças da repressão, no dia 27 de maio de 1969. No folheto, Patativa também cita a prisão do estudante Cajá. E insere, no poema, versos de um de seus poetas prediletos, Castro Alves, do poema O Navio Negreiro.

O folheto História de Abílio e seu cachorro Jupi faz parte de uma antiga tradição poética ibérica, em que o herói passa por muitos sofrimentos até ganhar a recompensa por sua bondade ou coragem, além de louvar a fidelidade dos animais. Certo senhor tinha três filhos, Grigório, João e o caçula, Abílio, que ganhou de seu padrinho o cachorro Jupi. Quando o pai morre, os irmãos, enciumados, amarram o cão fiel e levam o irmão para um passeio no mato, e lá o abandonam. Mas o cão foge e vai se encontrar com o dono. O menino e seu cão vivem numa caverna, protegidos por Nossa Senhora, até que um dia, adulto, ele vai embora, conhece uma velha senhora que lhe deixa a fortuna de herança. Casa-se com uma moça pobre, que tem duas irmãs. Um dia, dois maltrapilhos vagabundos chegam em sua casa. Contam seu drama, que abandonaram um irmãozinho assim-assim, foram presos, acusados por seu sumiço, e agora vagam pelo mundo, arrependidos. Abílio se dá a conhecer, perdoa os manos, e os acolhe.

Devoto do Padre Cícero Romão, Patativa dedicou à cidade que ele fundou o folheto Saudação ao Juazeiro do Norte. As romarias, a fé e os milagres do Padrinho dão a tônica ao poema. Já As façanhas de João Mole é um folheto entre o cômico e o moralista. O tal João apanhava todo dia da mulher, Zizi, e da sogra, Josefa, "a pantera e a serpente". Até que um dia, cansado de ser João Mole, revida cada pancada que recebeu e amansa as duas megeras: "depois de dar muitas pisas/ da praia até o sertão", João Mole vira cangaceiro do bando de Lampião. Em O Meu Livro, Patativa assume a personagem Chico Braúna, um "pobre de nascença/ deserdado da fortuna", mas que aprendeu tudo o que sabe no grande livro da natureza.

Outro folheto de cunho moralizante é Vicença e Sofia ou o castigo de mamãe. Romeu se apaixona pela Vicença, "preta da cor do carvão", para desgosto de sua mãe, que é toda cheia de mimos e paparicos com a outra nora, Sofia, "a mais bonita que havia/ praquelas banda de lá". É a própria sogra quem pega Sofia traindo o marido. Daí em diante se convence que a cor da pele não tem a menor importância, porque "gente preta e gente branca/ tudo é de Nosso Senhor". Gilmar de Carvalho também incluiu nesta seleta um dos mais belos poemas de Patativa, Antônio Conselheiro, no qual ele conta a história do profeta de Quixeramobim e líder de Canudos.

O cordel Emigração retoma o tema do sertanejo pobre sonhando uma vida melhor na cidade grande. E encontrando, além da fome que já trazia, um mundo hostil e pronto para levar ao crime as crianças que vagam nas ruas. A solução, o poeta diz qual seja - “bom conforto e boa escola/ um lápis e o caderno”. Já o folheto O Doutor Raiz desnuda a farsa dos raizeiros, fazedores de beberagens com que, sem o conhecimento verdadeiro das ervas, buscam ludibriar os sertanejos com promessas de curas maravilhosas. Um dos mais incríveis folhetos de Patativa, que também se vale de motivos ibéricos, é a história de Brosogó, Militão e o Diabo. Outro folheto que também desnuda o descaso com os nordestinos, enfrentando, além de todos os problemas, as constantes ameaças da seca, em ABC do Nordeste Flagelado. Finalizando o livro, dois poemas - o clássico Cante lá que eu canto cá e o belo A terra é naturá.


Biografia

Uma das principais figuras da poesia oral nordestina do século XX. Segundo filho de uma família pobre que vivia da agricultura de subsistência, cedo ficou cego de um olho por causa de uma doença. Com a morte de seu pai quando tinha oito anos de idade, passa a ajudar sua família no cultivo das terras. Aos doze anos, freqüenta a escola local por apenas alguns meses onde é alfabetizado. Mesmo antes disso já compunha versos próprios, que ele decorava. Aos dezesseis anos sua mãe vende uma ovelha e lhe dá sua primeira viola. À partir dessa época, começa a fazer repentes e a se apresentar em festas e ocasiões importantes. Por volta dos vinte anos recebe o pseudônimo de Patativa, por ser sua poesia comparável à beleza do canto dessa ave. Patativa viaja para Belém do Pará, e para Macapá (Amapá) onde apresentava-se como violeiro.

Volta para o Ceará para trabalhar na terra, indo constantemente à Feira do Crato onde participava do programa da rádio Araripe, declamando seus poemas. Numa destas ocasiões é ouvido por José Arraes de Alencar que, convencido de seu potencial, lhe dá o apoio e o incentivo para a publicação de seu primeiro livro, Inspiração Nordestina, de 1956.

Este livro teria uma segunda edição com acréscimos em 1967, passando a se chamar Cantos do Patativa. Em 1970 é lançada nova coletânea de poemas, Patativa do Assaré: novos poemas comentados, e em 1978 foi lançado Cante lá que eu canto cá. Os outros dois livros, Ispinho e Fulô e Aqui tem coisa, foram lançados respectivamente nos anos de 1988 e 1994. Foi casado com Belinha, com quem teve nove filhos. Faleceu na mesma cidade onde nasceu.

Patativa do Assaré foi a voz não só do sertanejo nordestino e dos trabalhadores rurais; mas de todos os injustiçados, marginalisados e oprimidos. Sua poesia, embora enraizada no sertão nordestino, é ao mesmo tempo universal por representar o sentimento de uma classe social com a autenticidade de quem é ‘do povo’. Além de poeta popular, foi cantador, violeiro, improvisador, poeta de bancada e também escreveu cordéis (apesar de não se considerar um "cordelista").

Obteve popularidade a nível nacional, possuindo diversas premiações, títulos e homenagens (tendo sido nomeado por cinco vezes Doutor Honoris Causa). No entanto, afirmava nunca ter buscado a fama, bem como nunca ter tido a intenção de fazer profissão de seus versos. Patativa nunca deixou de ser agricultor e de morar na mesma região onde se criou (Cariri) no interior do Ceará. Seu trabalho se distingue pela marcante característica da oralidade. Seus poemas eram feitos e guardados na memória, para depois serem recitados. Daí o impressionante poder de memória de Patativa, capaz de recitar qualquer um de seus poemas, mesmo após os noventa anos de idade.

A transcrição de sua obra para os meios gráficos perde boa parte da significação expressa por meios não-verbais (voz, entonação, pausas, ritmo, pigarro e a linguagem corporal através de expressões faciais, gestos) que realçam características expressas somente no ato performático (como ironia, veemência, hesitação etc). A complexidade da obra de Patativa é evidente também pela sua capacidade de criar versos tanto nos moldes camonianos (inclusive sonetos na forma clássica), como poesia de rima e métrica populares (por exemplo, a décima e a sextilha nordestina). Ele próprio diferenciava seus versos feitos em linguagem culta daqueles em linguagem do dia-a-dia (denominada por ele de poesia "matuta").

Patativa transitava entre ambos os campos com uma facilidade camaleônica e capacidade criadora e intelectual ainda não totalmente compreendidas pelo meio acadêmico. Sua obra, de dimensão tanto estética quanto política, aborda diferentes temas e possui outras vertentes além da social/militante; como a telúrica, religiosa, filosófica, lírica, humorística/irônica, motes/glosas, entre outras. As múltiplas tentativas de categorização da obra de Patativa do Assaré (muitas vezes subjetivas e sem base teórica) expõem falhas inerentes dos próprios parâmetros de julgamento.

Estes, na maior parte, baseados em pressuposições e preconceitos que levam a dois extremos: a representação idealizada do mito, ou a visão ‘elitista’ de exclusão pela classe social, nível de escolaridade, etc.

[editar] Obras

[editar] Livros de Poesia

* 1956 - Inspiração Nordestina (2003)

* 1967 - Inspiração Nordestina: Cantos do Patativa

* 1978 - Cante Lá que Eu Canto Cá

* 1988 - Ispinho e Fulô (2005)

* 1991 - Balceiro. Patativa e Outros Poetas de Assaré (Org. com Geraldo Gonçalves de Alencar)

* 1993 - Cordéis (caixa com 13 folhetos)

* 1994 - Aqui Tem Coisa (2004)

* 2000 - Biblioteca de Cordel: Patativa do Assaré (Org. Sylvie Debs)

* 2001 - Balceiro 2. Patativa e Outros Poetas de Assaré (Org. Geraldo Gonçalves de Alencar)

* 2001 - Ao pé da mesa (co-autoria com Geraldo Gonçalves de Alencar)

* 2002 - Antologia Poética (Org. Gilmar de Carvalho)

Poemas

* A Triste Partida

* Cante Lá que eu Canto Cá

* Coisas do Rio de Janeiro

* Meu Protesto

* Mote/Glosas

* Peixe

* O Poeta da Roça

* Apelo dum Agricultor

* Nordestino Sim, Nordestinado Não

* Se Existe Inferno

* Vaca estrela e Boi Fubá

* Você e Lembra?

* Vou Vorá

[editar] Títulos e prêmios

* 1979 - Homenageado pela programação cultural do encontro da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, SBPC, em Fortaleza

* 1982 - Recebe o diploma de “Amigo da Cultura”, outorgado pela Secretaria da Cultura do Estado, pela “decidida atuação a favor do aprimoramento cultural do Ceará”

* 1982 - Cidadão de Fortaleza, título aprovado pela Câmara Municipal

* 1987 - Recebe a “Medalha da Abolição”, pelos “relevantes serviços prestados ao Estado”

* 1989 - Cariri Ceará - Doutor Honoris Causa pela Universidade Regional de Cariri

* 1989 - Inauguração da rodovia “Patativa do Assaré”, com 17 km, ligando Assaré a Antonina do Norte

* 1991 - Enredo da Escola Acadêmicos do Samba, de [[Fortaleza][]

* 1995 - Fortaleza Ceará - Prêmio do Ministério da Cultura na categoria Cultura Popular entregue pelo Presidente da República Fernando Henrique Cardoso no Teatro José de Alencar

* 1998 - Recebe, dia 22 de maio, a “Medalha Francisco Gonçalves de Aguiar”, do Governo do Estado do Ceará, outorgada pela Secretaria de Recursos Hídricos

* 1999 - Assaré Ceará - Inauguração do Memorial Patativa do Assaré

* 1999 - Título de Doutor Honoris Causa da Universidade Estadual do Ceará - UECE

* 1999 - Título de Doutor Honoris Causa da Universidade Federal do Ceará - UFC

* 1999 - Prêmio Unipaz, VII Congresso Holístico Brasileiro, Fortaleza, dia 20 de outubro

* 2000 - Na festa dos 91 anos, recebe o título de Cidadão do Rio Grande do Norte

* 2000 - Título de Doutor Honoris Causa da Universidade Tiradentes, de Sergipe

* 2001 - Terceiro colocado na eleição do “Cearense do Século”, promovido pelo Sistema Verdes Mares de Comunicação (o vencedor foi Padre Cícero).

* 2001 - Recebe o troféu “Sereia de Ouro”, do Grupo Edson Queiroz, no Memorial Patativa do Assaré, dia 28 de setembro

* 2002 - Prêmio FIEC, "Artista do Turismo Cearense", Fortaleza

* 2003 - Prêmio UniPaz, V Congresso Holístico de Crianças e Jovens, Fortaleza

* 2005 - Inauguração da "Biblioteca Pública Patativa do Assaré", Piauí

* 2004 - Título EFESO "Cidadão Empreendedor"(Escola de Formação de Empreendedores Sociais)

* 2004 - Troféu MST (Homenageado pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra)

* 2005 - Homenageado com Medalha Ambientalista Joaquim Feitosa

* 2005 - Inauguração da "Biblioteca Pública Patativa do Assaré", Vila Nova, Piauí

* 2005 - Título de Doutor Honoris Causa da Universidade (?), Mossoró, Rio Grande do Norte.